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COMO O CANDOMBLÉ SE TORNOU UMA RELIGIÃO CARA

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Antigamente, era muito comum presenciar feituras de vários ìyàwó ao mesmo tempo em virtude da dificuldade financeira. Essas feituras coletivas receberam o nome de “barcos”.

Esses “barcos” tinham um significado muito além do que vemos hoje em dia. Todos daquele barco seguiam juntos em sua evolução dentro do candomblé e todos entravam ao mesmo tempo pela ocasião de 1, 3, 5, 7 anos de feitura. Quando chegava o tempo de renovação, todas as pessoas daquele barco faziam suas obrigações juntas, pois tinham “nascidas” juntas. Numa linguagem mais figurada, era como se uma mãe tivesse dado à luz a gêmeos. Eram os irmãos de barco.

Nesses barcos, os materiais utilizados eram em número bem menor. Afinal, todos iniciaram juntos, compartilhando seus bichos, grãos, comidas de santo…com raras exceções. Isso mantinha a característica do barco, de pessoas que “nasceram” juntas. Para exemplificar mais claramente, quando um barco era iniciado ou iria fazer alguma renovação, borí etc era usado um único bicho de quatro patas, devidamente calçado com quatro bichos de pena para todos daquele barco.

Isso mantinha a característica do barco e ajudava muito a parte financeira, pois um dava o bicho de quatro patas, o outro os bichos de pena, o outro os grãos e assim por diante. Era assim antigamente.

Com a expansão do candomblé e o aumento do número de adeptos, a religião se popularizou…Quando algumas pessoas se deparavam com a situação de “barco”, passaram a questionar o motivo pelo qual teriam que “bancar” a obrigação daqueles que tinham menos condições. Claro que aqui não entra apenas a condição financeira mais abastada, mas o egoísmo em possuir status ou simplesmente por não querer se juntar à pessoas com as quais não tinham afinidades.

Começou o zumzumzum: Por que tenho que bancar a obrigação de fulano? Por que fulano só deu grãos e eu tenho que dar um bicho de quatro patas? Por que fulano gasta menos e eu tenho que gastar mais? Eu banco a minha, os outros que se virem.

Isso começou a gerar conflitos. Muitas pessoas esqueciam a natureza da religião dos orixás e buscavam apenas o status. Os pais e mães de santo se deparavam com uma nova situação em que algumas pessoas se recusavam a compartilhar com os irmãos. Se não cedessem, eles buscariam outras casas que fariam conforme seus desejos. Se impusessem, isso geraria ainda mais conflitos.

Começava, então, uma nova configuração de barcos: cada um comprava as suas coisas, ou seja, um bicho de quatro patas para cada pessoa devidamente calçado com quatro bichos de pena, grãos em separado, comidas em separado…Mesmo que estas pessoas tivessem suas obrigações feitas juntas, cada um tinha suas coisas.

Até mesmo outros pais e mães de santo começaram a criticar quem recolhia barcos como era feito antigamente, chamando essas casas de marmoteiras. Então, a saída encontrada apenas para cessar conflitos tornou-se regra e, com ela, o custo para uma obrigação ou iniciação foi às alturas. Hoje, o candomblé é uma religião cara, de alto custo, de valor enormemente elevado.

Quando comento sobre os barcos de antigamente com pais e mães de santo antigos, eles concordam e relembram saudosistas do quanto um barco tinha uma ligação forte. Todos juntos, gerados juntos, iniciados juntos e evoluindo juntos. Mas também escuto que “isso é marmotagem”, “coisa da minha cabeça”, “coisa que eu inventei” de outros pais e mães de santo.

A exceção virou regra imposta sob pena de ser chamado de marmoteiro. Os barcos tornaram-se iates de cruzeiro com valores astronômicos, muitas vezes excluindo quem mais necessita.

FONTE : TVR USM

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